A Religião Africanista no Brasil
Os africanos trouxeram consigo as suas culturas originais e, junto a elas, todo um corpo de crenças e rituais religiosos. Atualmente as religiões africanas afirmam sua sobrevivência de maneira flagrante do norte até o sul do país. Tais religiões sobrevivem graças ao sincretismo entre elas próprias, entre elas e o catolicismo (religião dominante), e entre elas e o espiritismo. Esta mistura de crenças e rituais é tão evidente que já não dizemos no Brasil religiões "africanas" e sim religiões "afro-brasileiras".
O continente africano pode ser dividido em duas partes, cortando á altura do Golfo da Guiné. Dessa linha para cima, as culturas negras são chamadas sudanesas e desse paralelo para baixo, chamados de bantos.
Dos negros sudaneses, as culturas que mais pesaram no Brasil foram a nagô e a gêge, provenientes da Nigéria e do Daomé respectivamente. Coube à cultura nagô (iorubana) a hegemonia em todo o Brasil, de norte a Sul.
Já na África, essas e outras culturas influíam-se reciprocamente. Com o périplo africano realizado pelos navegadores portugueses, chegaram às costas africanas as "missões", as crenças e rituais cristãos, especialmente católicos, que deram origem ao sincretismo com os cultos negros.
Este fenômeno foi muito acentuado no Brasil, devido à promiscuidade das senzalas, onde negros de diversas culturas conviviam lado a lado, favorecendo o sincretismo entre as próprias religiões africanas trazidas para cá. Depois, por ser o catolicismo a religião oficial durante o período colonial e imperial (1500 a 1889), as manifestações exteriores das demais religiões, inclusive as práticas mais primitivas dos negros, foram comprimidas pela Igreja. Este fato veio a possibilitar aos negros a manutenção dos cultos e rituais que, por um mecanismo de defesa, avivaram cada vez mais, em extensão e profundidade, o sincretismo de suas crenças com as da Igreja, mascarando seus deuses com os nomes de santos católicos. Com tal subterfúgio respeitavam a lei, a Igreja, e continuavam cultuando seus deuses africanos.
Este processo de identificação entre os orixás (divindades) e os santos católicos foi facilitado objetivamente por semelhanças de "especialização", semelhan- ças "profissionais" entre eles. Tais como Xangô sincretizado com São Jerônimo, Iansã com Santa Bárbara, Ogum com São Jorge e assim por diante. Entre os sudaneses se cultuavam os orixás (entidades sobrenaturais, intermediários entre os homens e Olorun, o deus maior e superior a todos), já entre os bantos do Sul se veneram os espíritos ancestrais, de pessoas humanas que viveram efetivamente.
Em Benguela, Angola, sabe-se que existia o culto "orodere", semelhante ao chamado "espiritismo", por isso também foi fácil aos negros de origem banto amoldarem-se às práticas espíritas que se desenvolveram no Brasil. Dessa diferença entre os cultos sudaneses e bantos derivou uma diferença nas religiões afro-brasileiras. De um lado temos o Xangô em Pernambuco, o Candomblé na Bahia e o Batuque no Rio grande do Sul, todos eles com origem sudanesa, estas diversas designações são apenas rótulos regionais para um mesmo conteúdo.
De outro lado, por parte das culturas bantas a mercê de um grande sincretismo, nasceram todas as casas chamadas de "umbanda", criando no Brasil uma nova religião, nas quais são cultuados, além de orixás, espíritos ancestrais, os "espíritos-guias", assim denominados por influência espírita.
No Brasil as misturas se acentuaram juntou-se também, as tradições e as crenças dos nativos americanos, este sincretismo das religiões negras com elementos das culturas indígenas deu origem a um novo tipo de culto: o "candomblé de caboclo", onde são cultuados os orixás africanos juntamente com os deuses indígenas.
Nos cultos sudaneses são usados línguas africanas, principalmente o nagô e o gêge. Já nas casas de umbanda e caboclo, domina o português, misturado a palavras africanas e expressões em tupi.
A Influência Negra no Rio Grande do Sul
O negro aparece no Rio Grande do Sul em 1725, com a frota de João Magalhães, vinda por terra. Estes negros, certamente escravos, realizavam o serviço pesado. Porém oficialmente a presença negra, no território gaúcho, data de 1737, quando o Brigadeiro José da Silva Paes se estabelece na Barra erigindo o Presídio Jesus, Maria e José, marco inicial da nossa colonização. Durante muitos anos esta região, distante e hostil, denominada Continente, foi usada como ameaça contra os escravos rebeldes ou preguiçosos do centro do Brasil, sendo estes enviados para este local, considerado por eles como pior que o inferno, um autêntico degredo na solidão verde do pampa.
Assim deu-se o inicio da colonização negra no Rio Grande do Sul, estendendo para o Prata clandestinamente. O negro marcou sua presença, indelevelmente, na História, na Geografia, no folclore, no linguajar, nas artes, no esporte e na política. Na historia, há uma notável participação dos negros durante a Guerra dos Farrapos e na Guerra do Paraguai, nesta ultima lutaram substituindo o sinhozinho branco e que, após a vitória, se recusaram a voltar para o Rio Grande.
Na Geografia são muitos os topônimos de origem negra no mapa gaúcho, inclusive alguns com o nome de quilombos.
No folclore, algumas lendas falam de escravos entre nós: As Torres Malditas, Cambai, Santa Josefa e o Negrinho do Pastoreio.
No linguajar, são correntes termos como: caiambola, cacimba, mondongo, mocotó.
Nas artes são inúmeras as influências de elementos negros, como o maior tambor brasileiro atualmente, o "sopapo". Artistas negros marcaram a cultura brasileira como Lupicínio Rodrigues, e o ator Breno Mello, o inesquecível Orfeu Negro do cinema.
No esporte bastaria a simples menção ao nome do tricampeão Everaldo e, antes dele, o grande Tesourinha, entre muitos outros mais recentes.
Na política, o grande nome é do Deputado Carlos Santos, de notável atuação parlamentar durante um quarto de século.
Na culinária gaúcha brasileira, três pratos têm etiologia negra: o mocotó, a feijoada e o quibebe.
Mas é na religiosidade popular que se encontra a cultura negra mais decisivamente. Desde o século passado, nota-se a existência de cultos negros em Porto Alegre com terreiros de batuque, que se proliferaram e hoje somam mais de 50.000 casas de Batuque em todo o Estado.